
Valores passaram a expirar e foram revertidos para o Consórcio PróUrbano após dois anos. Advogado alerta que validade dos créditos pode ser questionada na Justiça. Saldo do vale transporte some para passageiros do transporte público em Ribeirão Preto
Desde o início de abril, moradores de Ribeirão Preto (SP) têm relatado a perda de créditos antigos dos cartões do transporte público da cidade. O motivo é a aplicação de uma lei aprovada em 2022 pela Câmara que permite que os valores adquiridos pelos usuários tenham validade de apenas dois anos e, após esse prazo, são revertidos ao Consórcio PróUrbano, operador do sistema de transporte coletivo.
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A medida tem causado insatisfação entre usuários, especialmente trabalhadores que utilizam vale-transporte. À EPTV, afiliada da TV Globo, o advogado Ricardo Sobral afirma que, embora a lei tenha sido aprovada legalmente, a validade de apenas dois anos pode ser questionada juridicamente.
“Existe uma lei, e ela está sendo cumprida. No entanto, entendemos que esse prazo de dois anos é muito exíguo. Em normas trabalhistas, o prazo mínimo seria de cinco anos”.
A RP Mobi, empresa responsável pela gestão do transporte coletivo, e a Prefeitura informaram que a validade de dois anos dos créditos foi estabelecida pela gestão anterior e que a atual administração apenas cumpre o que foi determinado. O Consórcio PróUrbano não se pronunciou sobre o caso até a publicação desta notícia.
Saldo do vale transporte some para passageiros do transporte público em Ribeirão Preto, SP
Érico Andrade/g1
O que diz a lei?
A Lei Complementar nº 3.150, sancionada em dezembro de 2022, autorizou a Prefeitura a firmar um acordo com o consórcio para, entre outras ações, limitar a validade dos créditos a dois anos. O saldo expirado é revertido ao PróUrbano como receita e abatido do subsídio mensal pago pela Prefeitura. O prazo começou a contar 30 dias após a promulgação da legislação.
A medida tem relação com o novo modelo de custeio do transporte. Em 2023, a Prefeitura de Ribeirão Preto e o consórcio firmaram um aditamento ao contrato que passou a prever subsídio público. Desde então, o sistema passou a ser financiado não apenas pela tarifa paga pelos passageiros, mas também com recursos do município.
Em fevereiro de 2024, por exemplo, a tarifa real do transporte passou a ser de R$ 8,45, mas os usuários seguem pagando R$ 5. A diferença de R$ 3,45 por passageiro é bancada pela Prefeitura. De acordo com o Portal da Transparência, só em 2024, o valor pago ao consórcio já soma R$ 128,3 milhões.
‘Dinheiro poderia ser devolvido ao trabalhador’, diz advogado
Sobral lembra que o vale-transporte, embora repassado pela empresa, é parcialmente custeado pelo próprio trabalhador, com desconto de até 6% do salário. Por isso, na avaliação dele, a perda do valor fere o direito do usuário.
“Mesmo com o uso de tecnologias, esse dinheiro poderia ser devolvido ao trabalhador ou à empresa que pagou a cota-parte. Há margem para o Judiciário avaliar se esse confisco é realmente legal”, completou.
O advogado também alerta que o Código de Defesa do Consumidor considera nulas as cláusulas contratuais que imponham obrigações excessivas ao consumidor, o que pode reforçar a tese de abusividade nesse caso. Ele recomenda que os trabalhadores guardem prints e extratos dos saldos como forma de comprovação.
“Individualmente, a ação pode não valer a pena, já que os valores costumam ser baixos. Mas há chance de o tema ser debatido em ações coletivas ou por órgãos como o Ministério Público, OAB [Ordem dos Advogados do Brasil] ou partidos políticos com representação”, disse.
O que o usuário do transporte pode fazer?
Diante do cenário, a recomendação é que o usuário do transporte público salve os comprovantes de saldo, como extratos ou prints de tela, para o caso de uma eventual ação judicial.
“Se o trabalhador tiver registro de quanto perdeu, poderá ter esse valor restituído no futuro, caso o entendimento do Judiciário seja de que houve irregularidade”, orienta Sobral.
Apesar de ser possível buscar a Justiça individualmente, o especialista ressalta que, por se tratar de valores baixos, o custo do processo pode ser maior do que o valor a ser recuperado. Por isso, a alternativa mais viável seria aguardar a atuação de órgãos como o Ministério Público, Defensoria Pública e OAB.
Terminal de ônibus transporte público no Centro de Ribeirão Preto, SP
Érico Andrade/g1
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